Entrevista com Andriolli Costa
Recentemente, tivemos a oportunidade de conseguir uma entrevista com o ilustre Andriolli Costa. Como organizador da página Colecionador de Sacis, Andriolli posta diariamente algo novo remetente ao Saci-Pererê, personagem bastante conhecido do folclore brasileiro, seja uma arte, uma escultura, uma referência, uma menção em algum tipo de postagem, entre outros.
Se você ainda não conheceu a sua página, você pode acessá-la clicando aqui. E caso você ainda não conheça o Saci-Pererê de A Bandeira do Elefante e da Arara, você pode ler sobre sua participação na história clicando aqui. Veja abaixo a entrevista com Andriolli Costa.
1 – Nos fale sobre você.
Meu nome é Andriolli Costa, tenho 25 anos e sou natural de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Sou jornalista de formação, e atualmente faço doutorado em Comunicação na UFRGS. Desde a graduação – na iniciação científica – venho pesquisando folclore. Entre 2010 e 2011, por meio de um edital de fomento público, produzi a Revista Eletrônica Poranduba, um site totalmente voltando para matérias sobre a cultura popular brasileira. O que eu mais gostava era de escrever sobre mitos e lendas. Entrevistei, por exemplo, a jornalista responsável pelo livro “Lobisomem Existe!”, sobre a cidade de Joanópolis (a capital do Lobisomem). Também conversei com os criadores da Associação dos Caçadores de Assombração de Mariana, MG, que lançaram um concurso em que pagariam R$ 1000 por uma fotografia de um mito local, o Caboclo D’água. O modo como o folclore mexe com os imaginários, influenciando modos de sentir, pensar e agir do povo sempre me encantou.
2 – De onde, e quando, surgiu a ideia do “Colecionador de Sacis”?
Surgiu em 2014, quando ao caminhar por São Leopoldo/RS, notei um toco de árvore cheio de orelhas de pau. Dizia Monteiro Lobato que quando um saci fica velho e morre, ele se transformava numa orelha de pau, então postei no Facebook que a cidade era um grande cemitério de Sacis. O post fez sucesso, pois pouca gente conhecia o fato. Mais tarde, no dia 31/10, o Dia do Saci, pedi pra minha namorada fazer duas carapuças de saci e levei para o trabalho, na Unisinos. Lá, fizemos um pequeno ensaio fotográfico, mobilizando amigos e estagiários. Percebi nesse momento que precisava de um canal para centralizar essas postagens. Assim que voltei de férias, em janeiro deste ano, criei o Colecionador.
3 – Dentre todos os seres folclóricos brasileiros, por que você escolheu o Saci?
O Saci sempre me fascinou e a origem não é outra que não minha própria família. Estou produzindo um documentário sobre Sacis (que espero lançar ano que vem) e as primeiras pessoas que quis entrevistar foram meus avós. A vó Marlene aprendeu com minha tataravó, Dona Floriza, a imitar saci para botar medo nos filhos. Ela pintava a cara de preto e tudo mais, mas nem precisava disso tudo. Só o assobio peculiar já gelava o espinhaço dos meninos, que iam rapidinho varrer o terreiro ou arrumar o quarto. Meu avô diz que desde que a vó parou de imitar, o saci nunca mais apareceu na chácara. Os fatos estão relacionados, mas não são a mesma coisa . Diz ele que é a imitação que chama o saci, doido por uma diabrura, que fica pelas redondezas pronto para pegar uma peça em alguém.
Outro motivo, este mais formal, é que o saci concentra a trindade mestiça formadora do povo brasileiro da qual falava Silvio Romero. Ele começa como o anão Guarani Yasi Yateré, com duas pernas e branco. Com a chegada dos negros ao Brasil, que se tornam referência na contação de histórias, ele passa a ser o negrinho perneta que conhecemos. Por fim, a carapuça vermelha e as palmas mãos vazadas (como registram algumas versões) estão relacionadas ao Fradinho da Mão-Furada, duende conhecido do folclore português. As pessoas brincam, dizendo: “veja o panda. Ele é preto, branco e asiático”. Eu diria “veja o saci. Ele é preto, branco e indio”.
4 – De todos os materiais, envolvendo sacis, compartilhados em sua página, qual o seu favorito? Por quê?
Eu gosto muito dos tweets, porque é neles que a gente Ve a cultura popular sendo revisitada em dinâmicas contemporâneas que apenas o povo é capaz de criar. Eu escrevi um artigo científico sobre saci nas redes sociais e fiz uma coleta de três dias. Foram quase 500 tweets mencionando Sacis, e 12% deles eram variações da frase ” Minha vida está mais parada que saci de patinete”. As vezes não é a vida, é a timeline, o whatsapp, ou algo assim, mas sempre nesse contexto. Da mesma maneira, tem muita gente que fala em saci quando engessa um pé, quando perde um objeto, quando acorda com cabelo enozado… Ver como o saci está presente hoje no imaginário cotidiano, não em manuais ou dicionários de folclore, é o mais empolgante.
5 – O que você acha sobre o Saci do mundo d’A Bandeira do Elefante e da Arara?
Acho um personagem fantástico, porque ele cumpre perfeitamente as funções narrativas de um “doador”. O saci não é apenas o trickster, que passa a perna nos personagens, mas é aquele que os fornece instrumentos ou conhecimento para o caminhar da trama. Ler a Bandeira do Elefante e da Arara é uma experiência muito interessante, porque a todo momento eu vou lendo e identificando as referências ou as fontes que o Cristopher usou para construir a história. Eu, que sempre pensei em dar forma as narrativas orais que estudei, vou me atentando as escolhas feitas pelo autor, as características que selecionou para este ou aquele mito folclórico. Recomendo a todos.
Ficamos muito agradecidos, Andriolli Costa! Pela sua disponibilidade, e por recomendar A Bandeira do Elefante e da Arara.
– Entrevista por Fernando M. A.