The World of Gerard van Oost and Oludara

Postagens marcadas com ‘personagens históricos’

Governadores do Brasil Colonial

Em “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara”, Gerard é chamado frente ao Governador Almeida para enfrentar acusações de “vadiagem e de praticar a religião protestante”.

Os governadores eram as autoridades supremas no Brasil Colonial, nomeados pelo próprio Rei e o representante da vontade do rei na colônia.

O cargo originou-se quando D. João III nomeou Tomé de Sousa o primeiro Governador do Brasil e o mandou estabelecer a capital, Salvador.

Tomé de Sousa

Criaram-se três cargos logo abaixo do governador: ouvidor-mor (chefe da justiça), capitão-mor (chefe da defesa) e provedor-mor (chefe da fazenda). No nível regional, assembleias foram formadas para garantir a ordem. Elas podiam comunicar-se com o governador ou diretamente com o rei.

Ao longo dos anos, a posição de governador evoluiu para o cargo de governador-geral e, eventualmente, para vice-rei, à medida que o Brasil e sua importância em Portugal expandiram.

Com exceção de dois períodos curtos onde a colônia foi dividida entre dois territórios diferentes com dois governadores (norte e sul, com sedes em Salvador e no Rio de Janeiro), o governador e o governo residiram em Salvador. Em 1763, perto do fim do período colonial, a capital foi transferida para o Rio de Janeiro. Em 1808, quando Príncipe João (mais tarde D. João VI) saiu de Portugal para morar no Brasil, a posição se extinguiu.

Caramuru

Em “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara”, Piraju e Gerard falam sobre Caramuru. Mesmo no final do século XVI, Caramuru já era uma lenda. Sua vida extraordinária mudaria a história do Brasil para sempre.

Nascido Diogo Álvares Correia, o Caramuru foi um português que naufragou no Brasil por volta de 1510, com 17 anos de idade. Apesar do seu naufrágio desfavorável, ele teve a sorte de ser levado pela maré até uma região que ficava há apenas dez quilômetros da Baía de Todos os Santos, um dos melhores portos naturais do mundo. Ele também teve a sorte de encontrar Paraguaçu, filha de Morubixaba Taparica, um grande cacique Tupinambá da região.

Diz-se que Caramuru impressionou os nativos por derrubar uma ave com um tiro explosivo do seu arcabuz, mas o que salvou a sua vida foi o amor de Paraguaçu. Eles se tornaram um casal, e com mais alguns sobreviventes do naufrágio e um grande número de tupinambás, ele formou sua própria tribo no lugar onde seria erguida a cidade de Salvador. Os tupinambás o deram o nome Caramuru, que provavelmente veio da palavra Tupi para enguia, em referencia ao seu comprido arcabuz que podia “ferroar”. Alguns, porém, dizem que o seu nome é uma distorção de “caraymuru”, que quer dizer “homem branco molhado”.

Cenas da vida de Caramuru

(Imagem: artista anônima. Mosteiro de São Bento da Bahia)

Por anos, Caramuru ajudou aos franceses e outros que visitavam o Brasil em busca de pau-brasil e outras riquezas. Os franceses nomearam o lugar onde encontraram o Caramura como “Pointe du Caramourou”. Caramuru salvou muitos marujos portugueses, franceses e espanhóis que naufragaram no Brasil e que foram capturados por outras tribos tupinambás. Sem a intervenção dele, estes marujos iam ser mortos ou, em alguns casos, transformados no prato principal da noite. Carlos V, imperador do Império Sagrado Romano, uma vez mandou uma carta de agradecimento ao Caramuru. Alguns sobreviventes e desertores permaneceram com Caramuru, se casando com suas filhas ou outras nativas, como aconteceu com o espanhol Piraju em “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara”.

Em 1526, Caramuru e Paraguaçu viajaram para a França. Em 1528, Paraguaçu foi batizada com o nome Katherine du Brézil, em homenagem à sua madrinha, Catherine dês Granches (esposa do explorador famoso Jacques Cartier). Na sua volta ao Brasil, Caramuru e Paraguaçu se tornaram o primeiro casal cristão brasileiro que temos conhecimento. Não há documentação que comprova nenhuma outra mulher cristã no Brasil na época, e poucas se mudariam para terras brasileiras até o final do século.

Pintura de Caramuru

Ao decidir colonizar o Brasil, os portugueses decidiram se aproveitar do relacionamento excelente do Caramuru com os nativos. Em 1536, Francisco Pereira Coutinho chegou ao Brasil e fundou a Capitania de Bahia. Ele aliou-se com Caramuru e cedeu oficialmente a sesmaria à terra da sua tribo, no coração da atual cidade de Salvador.

Quando chegou a hora de estabelecer o Governo Geral do Brasil, D. João III decidiu localizar a capital em Salvador, em grande parte devido à presença do Caramuru e seu prestígio com os nativos. Várias outras povoações haviam fracassadas por causa de brigas com os nativos, e os portugueses precisavam algum lugar estável para construir a sua base. D. João III mandou uma carta ao Caramuru em 1548, pedindo a sua ajuda em estabelecer o novo governo, a qual Caramuru ofereceu na chegada de Tomé de Souza um ano depois.

Caramuru morreu em 1557 e Paraguaçu em 1582. Caramuru foi imortalizado quando José de Santa Rita Durão publicou um poema épico sobre a sua vida em 1781.

Capa do livro “Caramuru – poema épico do descobrimento da Bahia”

Se o Caramuru nunca tivesse naufragado perto de Salvador, toda a história do Brasil poderia ser diferente.

Oba

Em “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara,” Oludara é convocado a viajar desde a sua vila até a cidade de Ketu para ter uma audiência com o oba.

Os líderes supremos de cada um dos sete reinos históricos iorubanos eram conhecidos como obas. Na maioria dos casos, eles se consideravam descendentes da orixá Odudua, mãe da Terra, e por isso eram considerados sagrados. Seus súditos precisavam se prostrar perante o oba. Depois, eles podiam sentar ou se ajoelhar na sua presença.

Súditos se prostram perante um obá enquanto exploradores portugueses fazem o seu primeiro contato – final do século XV

(Imagem: Wikipedia, domínio público)

Apenas obas podiam usar a regalia sagrada iorubana: uma coroa de contas em forma de cone, chinelos de contos e uma enxota-moscas adornado de contas. As coroas eram feitas de contas vermelhas de coral, introduzidas pelos portugueses. Os Obas usavam coroas diferentes para ocasiões diferentes, e cada cora tinha sua própria história. Estas coras contem linhas de contas que cobrem o rosto do oba, ao modo de proteger as pessoas do seu olhar divino.

Obá Ademuwgun Adesida II em traje tradicional, 1959.

(Imagem: Smithsonian Institution. Foto por Eliot Elisofon)

O oba era responsável por resolver problemas externos ao reino, e era autoridade máxima em questões jurídicas. Um conselho de anciões o aconselhava e escolhia o seu sucessor após a sua morte. Os balés (chefes das vilas), tipicamente os mais velhos da localidade, cuidavam de assuntos locais.

Devido à natura sagrada do oba, era impensável alguém fazer um ato de violência contra ele. Em algumas circunstâncias, porém, o oba tinha que cumprir um ato de violência contra ele próprio. Um exemplo é quando o povo se rebelava em protesto contra o oba. Neste caso, os chefes podiam exigir o suicídio dele. A tradição também exigia que o oba nunca podia ficar frente a frente com o Oni Oja (o administrador do mercado), sob pena de morte. Por isso, ele nunca podia sair do palácio no dia da feira.

A coroação de um oba novo era um processo comprido. O oba precisava fazer uma peregrinação e visitar vários lugares sagrados, participando de ritos estabelecidos, antes voltar à cidade para a coroação. Podia levar meses para completar todo o processo. Por exemplo, um dos passos era buscar a Ida Oranyan (a Espada de Oranyan ou Espada da Justiça) em Ile-Ifé e colocá-la nas mãos do Oba de Oyo.

Após tomar posse, o oba quase nunca saía durante o dia, exceto durante alguns festivais importantes. Ele podia, porém, sair do palácio à noite, incógnito.

 

Cabeça de oba de bronze – século XVI

(Imagem: www.metmuseum.org)

Os obas ainda existem nos reinos iorubanos atuais, porém as tradições foram modernizadas, principalmente durante os últimos cem anos. Por exemplo, o costume de suicídio desapareceu ao longo do tempo. O último oba forçado a tomar sua própria vida foi o Alaketu Adegbede em 1858. Quando ele saiu do palácio e viu o Oni Oja (talvez por arranjo dos seus inimigos), ele e duas das suas esposas tiveram que beber veneno.

Quem visita Benin e Nigéria hoje pode ter a chance de visitar um dos obas iorubanos e aprender mais sobre as suas tradições. Espero fazer a minha própria visita um dia!

 

O naufrágio da Madre de Dios

Em “O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e Oludara”, Piraju conta ao Gerard:

“Eu era marinheiro na nau espanhola Madre de Dios, que afundou aqui na Baía de Todos os Santos em 1535. A maioria dos sobreviventes do naufrágio foi morta pelos índios, mas vinte de nós fomos capturados para depois sermos usados em seus festejos canibalísticos. Quando já se preparavam para nos cozinhar, Caramuru apareceu e convenceu-os a nos libertar. Quase todos os meus companheiros voltaram para a Espanha; o que me aconteceu, porém, foi que as filhas do Caramuru com a princesa índia Paraguaçu eram as mulheres mais bonitas que eu já vira. Então, convenci uma delas a se casar comigo e me juntei à tribo.”

De fato, a nau Madre de Dios afundou na costa brasileira em 1535, na ilha de Biopeba. Mais de 100 dos 110 marujos conseguiram chegar à costa, mas a maioria foi massacrada pelos tupinambás. Dezessete escaparam em um barco pequeno para a ilha Tinharé, onde foram capturados por outros nativos. Eles teriam sido assassinados se não fosse pela chegada do famoso Caramuru, quem os convenceu a soltar os marujos.

Naufrágio por Joseph Vernet

Surgiu deste evento uma lenda famosa: Caramuru fora buscar sobreviventes porque sua esposa Paraguaçu tinha sonhado com um naufrágio. Em sua visão, ela enxergou um naufrágio de muitos homens, exauridos ou mortos, e entre eles uma única mulher com uma criança no colo. Caramuru descobriu o naufrágio e encontrou apenas homens, mas dentro dos destroços ele recuperou uma estátua da Virgem Maria com Jesus, a própria “Mãe de Deus” que sua esposa tinha visto na visão.

Pintura da visão de Paraguaçu, por Manuel Lopes Rodrigues

Seja como for, Caramuru resgatou os sobreviventes, e quando a maioria voltou à Espanha, quatro deles permaneceram com ele e sua tribo na Bahia. O Imperador Carlos V escreveu uma carta de agradecimento ao Caramuru pela ajuda dada aos sobreviventes.